Direitos humanos: IRR promove palestra sobre panorama histórico e a situação na Índia

_DSC7217

“Resgate histórico sobre direitos humanos e o caso da Índia” foram temas de uma palestra ministrada pelos pesquisadores Léo Heller e Priscila Neves, do grupo de Políticas Públicas e Direitos Humanos em Saúde e Saneamento, na última sexta-feira (1º/12), no auditório do IRR. O evento marcou o encerramento da 1ª Semana de Direitos Humanos da Fiocruz Minas, que, desde o dia 27 de novembro, contou com uma série de atividades, entre mesa-redonda, exibição de filmes, exposição de fotos e debates. As ações foram realizadas internamente, bem como em escolas situadas no entorno da unidade.

Durante sua apresentação, a pesquisadora Priscila Neves falou sobre as primeiras iniciativas relacionadas aos direitos humanos. Segundo ela, foi Ciro, o primeiro rei da antiga Pérsia, quem, em 539 a.C, deu os passos iniciais, ao libertar escravos e declarar que todas as pessoas tinham o direito de escolher a sua própria religião. Entretanto, na Idade Média, as pessoas ainda eram consideradas desiguais e somente com o surgimento da burguesia tal conceito começaria a ser questionado.

“Temos então as revoluções francesa e americana, que marcam a ida para a modernidade. Nesse contexto, temos, em 1789, a Declaração dos Direitos do Homem, proclamando as liberdades e os direitos fundamentais”, contou.

De acordo com a pesquisadora, a Revolução Industrial, marcada pela exploração dos trabalhadores, daria origem às revoluções socialistas, surgindo assim os direitos econômicos, sociais e culturais. Entretanto, durante a Segunda Guerra Mundial, todos os direitos foram tão duramente violados, que, finalizado o conflito, diversos países se juntaram para tentar impedir que tais violações ocorressem novamente. Foi, nessa época, que se elaborou a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

A partir daí, surgem os tratados que, depois de assinados pelo chefe de Estado de cada país e ratificados pelo respectivo Parlamento, passam a ter valor legal, ficando o país obrigado a cumprir.

“Os direitos humanos não são inflexíveis. Eles são complementados com o passar do tempo e, a partir do momento que se torna um direito, não deixa mais de ser. Eles também são individuais, interdependentes e interrelacionais, não podendo ser abordados de forma fragmentada”, explicou a pesquisadora.  “O que está por trás de todos os direitos é o conceito de que todos são iguais”, finalizou.

Índia- O pesquisador Léo Heller, que é relator especial da ONU para os direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário, falou sobre a situação da Índia. Heller retornou daquele país recentemente, onde esteve em uma missão para conhecer a realidade dos indianos e avaliar as condições da população em relação a esses dois direitos.

De acordo com o pesquisador, um relatório gerado em 2015 apontou que 40% da população da Índia – que é de 1,3 bilhão de habitantes- defecavam a céu aberto. Isso corresponde a 50% da população mundial afetada por essa prática, fazendo com que a Índia se tornasse, sozinha, responsável por 40% dos óbitos no mundo relacionados à diarreia e atribuídos à falta de serviços de água, esgotamento sanitário e higiene.

Por isso, segundo Heller, o governo indiano lançou um Programa de Combate à Defecação a Céu Aberto, tendo por objetivo incentivar, por meio de um sistema de microcréditos, a construção de privadas. Os banheiros são padronizados, e o esgoto é lançado em fossas duplas absorventes, que precisam ser esvaziadas, quando não tiverem mais capacidade de armazenamento.

“Os problemas gerados por esse sistema são vários; um deles é que a limpeza dessas fossas tem sido feita pelos dalits. A Índia tem um sistema de castas que ainda predomina e, embora seja proibido por lei, os dalits ainda são colocados nesse tipo de função, por serem consideradas inferiores”, contou.

As vilas que conseguem implantar as privadas ganham um selo que lhes garante outros benefícios. O impasse, entretanto, é que boa parte da população não vê problema em defecar a céu aberto. Assim, cria-se um conflito na comunidade, gerando uma série de constrangimentos.

“ Muitos idosos relatam que não conseguem usar a privada por não estarem habituados. Por outro lado, os que aderiram ao novo sistema fazem pressão para que possam ter direito aos outros benefícios. Há relatos de pessoas que fotografam aquelas que não estão usando as privadas”, explica Heller.

Outro ponto problemático é que as privadas não levam em conta as necessidades de pessoas com deficiência.

“Na verdade, as privadas têm muitos problemas. Um estudo encomendado pelo governo indiano concluiu que 1/3 dos banheiros funciona bem; 1/3 funciona bem agora, mas apresentará problemas no futuro e 1/3 não está ok nem mesmo agora”, revelou. Segundo Heller, também há relatos de mortes por colapso de fossa e quedas durante a limpeza.

Em relação ao acesso à água, a situação é tão crítica quanto em relação ao esgotamento sanitário. Segundo o pesquisador menos de 50% da população rural tem água tratada. Isso em um país que tem 67% dos habitantes concentrados fora da zona urbana. Com isso, o transporte manual de água ainda é frequente e o risco de contaminação é grande. A situação não é muito melhor na área urbana, cuja fonte principal de água é a subterrânea e que, em várias partes do país, é contaminada quimicamente por arsênio e flúor.

“Mas o que tudo isso tem a ver com direitos humanos?”, pergunta o pesquisador, que, em seguida, responde: “Discriminação, entre quem tem e quem não tem acesso. Há muita desigualdade regional. Em todo o país, o padrão de serviço é muito inferior ao prescrito pelos padrões dos direitos humanos. Por mais que estejam implementando algumas ações, estas ainda parecem insuficientes”, destacou.