Fiocruz Minas e parceiros levam projeto com foco em saúde única para populações ribeirinhas do Pantanal

fotoNAVIO

Pesquisadores da Fiocruz Minas estão envolvidos em uma iniciativa que leva serviços de saúde para populações ribeirinhas que vivem às margens do Rio Paraguai, em comunidades situadas nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Trata-se do projeto Navegação Ampliada para a Vigilância Intensiva e Otimizada (NAVIO), cujo diferencial é desenvolver ações dentro de uma perspectiva de saúde única, ou seja, considerando que seres humanos, animais e o meio ambiente estão intimamente ligados e são interdependentes. Dessa forma, o projeto conta com uma estratégia que inclui, além de assistência médica e odontológica, análises epidemiológicas, genômicas e climáticas, obtendo uma compreensão mais aprofundada sobre as interações entre os organismos causadores de doenças, vetores, hospedeiros e o ambiente. Todo o trabalho é desenvolvido em parceria com as secretaria de estado de saúde do Mato Grosso do Sul (SES-MS) e do Mato Grosso (SES-MT) e a Marinha do Brasil.

“O projeto NAVIO amplia um trabalho já desenvolvido pela Marinha há algum tempo, que consiste em levar atendimento médico e odontológico para essas comunidades. Com o projeto, além desses serviços, vamos investigar o que está circulando nessa região, onde populações isoladas, por vezes negligenciadas, vivem em contato com diferentes animais. Para isso, são realizados exames de amostras de sangue, fezes e da secreção orofaríngea em todas as pessoas que aderem ao projeto. Também são coletadas amostras de animas silvestres, domésticos e de insetos vetores, bem como da água e esgoto da região. Todo o material coletado passa por uma série de análises, que vai permitir identificar doenças já existentes e fazer previsões sobre as que possam vir a ocorrer”, explica o pesquisador da Fiocruz Minas Luiz Alcântara, idealizador e coordenador do projeto.

Até então, a Marinha atuava com uma embarcação, o Navio de Assistência Hospitalar (NAsH), que possui um ambulatório onde acontecem os atendimentos, mas com a expansão das atividades, mais dois navios passaram a fazer parte da frota: o Paraguassu, que conta com laboratório para sequenciamento genético; e o Potengi, que dispõe de laboratórios de diagnóstico sorológico e molecular, de parasitologia para exames de fezes (humanas e animal), e de processamento para de água e esgoto coletados. Segundo Alcântara, foi montada uma miniversão do Laboratório Central de Saúde Pública (LACEN), contando com insumos e equipes das secretarias de saúde do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul. Toda essa estrutura possibilita testar as amostras coletadas para diferentes doenças, entre elas dengue, chikungunya, zika, Covid-19, influenza, HIV, HTLV, sífilis, leptospirose, febre maculosa, leishmaniose, doenças fúngicas e diferentes parasitoses intestinais.

O projeto NAVIO terá duração de cinco anos e prevê dez viagens. A primeira delas já ocorreu. As embarcações percorreram cinco comunidades, situadas entre os municípios de Ladário e Porto Murtinho, o chamado Tramo Sul, no Pantanal do Mato Grosso do Sul, no período entre 20 de novembro e 10 de dezembro de 2023. Cerca de 450 pessoas receberam atendimento, resultando em 359 adesões ao projeto. Ao todo, 2061 testes rápidos foram realizados para diferentes agravos. Houve ainda uma coleta de diferentes espécies de insetos.

“Capturamos cerca de dois mil insetos. Todos eles são testados, por meio do PCR, para cada uma das arboviroses já conhecidas, para verificarmos se estão atuando como vetores das doenças. Quando positivo, fazemos o sequenciamento do genoma. Esse mesmo procedimento é feito com as amostras humanas, o que vai nos possibilitar compreender como se dá o ciclo de transmissão de doenças, quando houver casos confirmados”, explica o pesquisador da Fiocruz Minas Álvaro Gil Araújo Ferreira, que também integra a equipe de coordenação do projeto. De acordo com o pesquisador, a coleta de insetos poderá ajudar, também, a detectar a presença de novos flavivírus em circulação, sendo esta região investigada, um corredor para entrada destes no Brasil e países vizinhos do sul da América do Sul vírus, como, por exemplo, o vírus da febre do Nilo Ocidental e o vírus da encefalite venezuelana. “Nesse caso, o vetor é o Culex, que as pessoas conhecem como pernilongo. No Brasil, o vírus da febre do Nilo Ocidental já foi detectado em cavalos, aves e humanos e, por isso, a vigilância se torna fundamental. Além disso, o vírus da encefalite venezuelana está emergindo atualmente da Argentina”, avalia.

A próxima etapa do projeto acontecerá entre os dias 12 de fevereiro e 14 de março deste ano. Desta vez, as embarcações vão percorrer um trecho maior, o chamado Tramo Norte, que abrange 13 comunidades, entre Ladário no Mato Grosso do Sul e Cáceres, no Mato Grosso.

O projeto Navio conta com o apoio de diversas instituições, entre elas Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde (SVSA/MS), Fiocruz Mato Grosso do Sul, LACENs de MS, MT, MG, PR, BA e GO, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal de Ouro Preto, Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, Universidade Estadual de Feira de Santana da Bahia, Organização Pan-Americana da Saúde/ Organização Mundial da Saúde(OPAS/OMS), Loccus Solution, Bio-Manguinhos, Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), prefeituras de Ladário, Corumbá, Porto Murtinho e Cáceres, Instituto Erasmus de Roterdan (Holanda), Universidade de Stellenbosch (África do Sul), Universidade de Sidney (Austrália), Universidade de Washington (Seattle-EUA) e National Institutes of Health (NIH dos EUA).